Identificação por elementos além de URLs

Data do Julgamento:
24/02/2015

Data da Publicação:
06/03/2015

Tribunal ou Vara: Tribunal de Justiça de Minas Gerais - TJMG

Tipo de recurso/Ação: Agravo de Instrumento

Número do Processo (Original/CNJ): 0807534-37.2014.8.13.0000

Nome do relator ou Juiz (caso sentença): Desª. Mariângela Meyer

Câmara/Turma: 10ª Câmara Cível

Artigos do MCI mencionados:

Artigo 19 "caput" e § 1º.

Ementa:

"AGRAVO DE INSTRUMENTO - AÇÃO CAUTELAR INOMINADA - LIMINAR DEFERIDA - FACEBOOK - RETIRADA DE CONTEÚDO OFENSIVO - INDICAÇÃO DAS URLS - MEDIDA DISPENSÁVEL - ARTIGO 19, § 1º DA LEI 12.965 - INDICAÇÃO PRECISA DO CONTEÚDO - OUTROS MEIOS POSSÍVEIS - DECISÃO MANTIDA - RECURSO NÃO PROVIDO.
- O artigo 19, § 1º da Lei 12.965/14 determina a indicação precisa do conteúdo ofensivo a ser excluído da internet, o que pode ser obtido por outros meios além da indicação das URLs.
- Assim, havendo elementos suficientes para identificação precisa das publicações a serem retiradas da rede social, deve ser cumprida a ordem judicial.
- Recurso não provido. Decisão mantida."

  • - Omar Kaminski - [ Gestor do OMCI ]
    - Omar Kaminski - [ Gestor do OMCI ] em 01/06/2015

    Seguem excertos de algumas decisões dos Tribunais que demonstram uma relativização quanto à questão da "identificação clara e específica do conteúdo" para o fim específico de possibilitar "a localização inequívoca do material". Podemos notar que existe o reconhecimento de possibilidades outras além e tão somente da indicação da URL. Vejamos:

    “Ainda a respeito, e sobrevinda a Lei do Marco Civil, não se toma de modo tão estrito, de imposição de indicação da URL, o preceito do artigo 19, parágrafo 1º. Exige-se indicação suficiente. Ademais, não se há de supor nesta matéria senão a facilitação da defesa de quem seja terceiro vítima", citando precedentes do STJ. (TJSP, 1ª Câmara Reservada de Direito Empresarial, AI 2221006-60.2014.8.26.0000, Relator Des. Claudio Godoy, j. 19/12/2014);

    “Ressalte-se que o Marco Civil da Internet, em seu art. 19, §1º apenas determina que a identificação do conteúdo a ser excluído seja claramente e especifica, como ocorre no caso em tela haja vista sua expressa menção na r. decisão recorrida e nos prints trazidos pelo agravado. Não há, assim, qualquer dificuldade para cumprimento da ordem judicial. (...) Neste diapasão conclui-se que é dispensável a indicação das URL's das páginas onde os comentários a serem excluídos estão inseridos, pois foram claramente identificados de outra forma.” (TJSP - 5ª Câmara de Direito Privado, AI 2198454-04.2014.8.26.0000, Relator Des. Moreira Viegas, j 03.12.2014);

    “Por fim, registro que a exigência trazida pelo § 1º do art. 19 da Lei nº 12.965/2014 é a “identificação clara e específica do conteúdo apontado como infringente, que permita a localização inequívoca do material”, o que era possível à época da prolação da decisão, mesmo estando ausente a indicação da URL. Logo, a decisão proferida está em consonância com a lei, eis que a exigência legal consubstancia-se na possibilidade de identificação, independentemente da forma que ocorra.” (TJRS - 1ª Turma Recursal Cível, ED 0045749-59.2014.8.21.9000, Relatora Juíza Fabiana Zilles,  j. 25.11.2014).

  • Walter Aranha Capanema
    Walter Aranha Capanema em 15/05/2015

    O art. 19, § 1º da Lei 12.965/2014 é uma norma de cunho processual, voltada primordialmente para o magistrado, e que determina o requisito formal para a decisão judicial que indisponibilizar conteúdo infringente (ofensivo):
     

    § 1º A ordem judicial de que trata o caput deverá conter, sob pena de nulidade, identificação clara e específica do conteúdo apontado como infringente, que permita a localização inequívoca do material.


    Tal ordem é direcionada para um “provedor de aplicação”, denominação que abarca um espectro tecnológico quase ilimitado: sites, redes sociais, serviços, portais, aplicativos etc.

    A lei exige que a ordem judicial, seja interlocutória ou definitiva, individualize, com precisão e clareza, o referido conteúdo, para que, assim, possa ser localizado e tornado indisponível.

    Em caso de descumprimento dessa determinação, a decisão judicial estará eivada de nulidade, a qual poderá ser decretada ex officio pelo juiz ou a requerimento das partes.

    Parece que a razão para tamanho rigor foi para limitar a atuação jurisdicional, de sorte a não atingir conteúdos e sites de terceiros que não tenham qualquer ligação com o dano ocorrido. Evitaria-se, assim, tornar indisponível um servidor inteiro apenas por causa de um arquivo.

    É interessante notar que, em situações semelhantes, como na busca e apreensão (art. 461-A, § 2º, CPC) e no sequestro (arts. 822 a 825, CPC), não há a imposição de tal sanção. E são medidas que podem repercutir, também, em bens de terceiros.

    Por outro lado, a norma em debate não exige que a parte indique o endereço da Internet que este conteúdo está localizado (URL – Uniform Resource Locator), afinal, a rede não é regida apenas por endereços.

    Imagine-se, por exemplo, a situação em que o infrator tenha criado, em um jogo online, um personagem difamante. Como localizá-lo ? “É o terceiro mago à esquerda do castelo atrás do rio”? Não é razoável, certamente. A simples descrição já será suficiente para atender o comando legal.

    E qual o efeito de um erro material? O conteúdo lesivo está hospedado em http://www.sitedanoso1234.com.br/XYZ.jpg, mas o juiz determinou a retirada de http://www.sitedanoso1243.com.br/XYZ.jpg . Seria caso de nulidade?

    Em respeito aos princípios constitucionais da celeridade e da razoável duração do processo (art. 5º, LXXVIII, CRFB), deve-se afastar a imposição da nulidade, permitindo a correção pelo magistrado ou, em caso de erro material evidente, pelo próprio destinatário da ordem judicial.

    O que a lei determina é que o conteúdo esteja indisponível, isto é, que fique inacessível aos demais usuários da Internet. Nada impede, contudo, que a parte pleiteie a retirada, em que as informações seriam apagadas.

    E, por se tratar de uma obrigação de fazer, poderá o juiz valer-se das medidas coercitivas do art. 461, § 5º, CPC, especialmente a multa diária, a ser determinada de acordo com o patrimônio do provedor de aplicação.

    Será possível o magistrado determinar a prisão pelo crime de desobediência, em caso de descumprimento? O Superior Tribunal de Justiça entende que não, pois já existe a coerção no Código de Processo Civil. Nesse sentido:
     

    DIREITO PROCESSUAL CIVIL. IMPOSSIBILIDADE DE DECRETAÇÃO OU AMEAÇA DE DECRETAÇÃO DE PRISÃO NO EXERCÍCIO DE JURISDIÇÃO CÍVEL, RESSALVADA A OBRIGAÇÃO DE NATUREZA ALIMENTÍCIA. Não é possível que o magistrado, ao conceder tutela antecipada no âmbito de processo cível cujo objeto não consista em obrigação de natureza alimentícia, efetue ameaça de decretação de prisão para o caso de eventual descumprimento dessa ordem judicial, sob a justificativa de que, nesse caso, configurar-se-ia crime de desobediência (art. 330 do CP). Isso porque não se admite a decretação ou a ameaça de decretação de prisão nos autos de processo civil como forma de coagir a parte ao cumprimento de obrigação, ressalvada a obrigação de natureza alimentícia. Precedentes citados: HC 125.042-RS, Quarta Turma, DJe 23/3/2009; RHC 16.279-GO, Primeira Turma, DJ 30/9/2004; e HC 18.610-RJ, Quinta Turma, DJ 4/11/2002. RHC 35.253-RJ, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em 5/3/2013.


    Deve-se ter em mente, sempre, que o processo é um instrumento para a proteção de um direito material, e não o contrário. As formalidades, dependendo do caso concreto, podem ser afastadas para a plena prestação jurisdicional.